Quando a polarização política afeta a saúde mental

Intolerância atingiu níveis absurdos e jamais vistos na política brasileira

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Intolerância e ofensas com quem pensa diferente

No domingo, 30, quando Willian Bonner anunciou que o petista Luiz Inácio Lula da Silva era matematicamente vencedor e portanto estava eleito presidente da república, a catarinense Zezé, explodiu de ódio, fúria e raiva. Falou todos os palavrões que lembrava e dali em diante nas próximas horas precisou ser contida por seu marido e filhos. Sobrou insultos para a Globo, o PT, o Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, a esquerda e até Simone Tebet foi lembrada por Zezé. 

Bolsonarista fanática, Zezé tem um irmão e um filho que moram em Massachusetts e ambos votaram em Lula para desgosto dela. Quando ela viu as postagens deles nas redes sociais comemorando a vitória de Lula, ficou ainda mais furiosa e as mensagens que ela mandou no WhatsApp para ambos são absolutamente impublicáveis. “Minha irmã perdeu totalmente o prumo e também a razão e confesso que fiquei enojado quando ouvi as mensagens dela. Ela insultou a mim, minha mulher e meus filhos com ofensas tão pesadas que jamais imaginei que alguém pudesse proferir. O filho dela também foi xingado e destratado e ela estava tão louca que ofendeu a mulher dele, que também são eleitores do Lula. E olha que ele paga o plano de saúde dela além de dar dinheiro todos os meses. Nunca pude imaginar que minha irmã estivesse tão doente e com a mente comprometida por causa da política. Essa polarização destruiu e desuniu nossa família e acho que nunca mais seremos os mesmos depois desta eleição”, diz Francisco, que pediu para que seu sobrenome fosse omitido. Casos semelhantes ao de Zezé e Francisco estão acontecendo em milhares de famílias de brasileiros e a tendência é que aumentem nos próximos meses e anos.

A polarização política chegou a tal nível de stress que atingiu famílias inteiras que para muitas pessoas fazendo com que a normalização das relações demorará a acontecer, sem contar as amizades desfeitas e xingamentos e  também os bloqueios nas redes sociais. A reportagem do Metropolitan News USA, entrevistou com exclusividade a psicóloga e psicoterapeuta Flávia Feijó, acerca do assunto e de como a polarização pode ser considerada doença mental.

Confira as respostas de Flávia Feijó.
Qual é o impacto da polarização política na saúde mental?
Sem dúvida alguma, a participação do cidadão no processo político é fundamental. Porém, muitas pessoas perdem o foco e objetivos das eleições e passam a ter pensamentos extremistas, o que acaba afetando a saúde mental. Hoje em dia já existem estudos direcionados ao que se chamam de “election related stress” ou “election stress disorder” uma condição não exclusiva da população brasileira, e que ainda não pertence ao DSM, mas que tem chamado muito a atenção de cientistas pelos comportamentos que afetam áreas que envolvem a saúde mental, como trabalhar, socializar, entre outros. 

Quais são as consequências psicológicas das fake news?
Certamente, basear-se em informações que não tem conteúdo verídico pode afetar a interação com outros, gerando argumentos e comportamentos que não são saudáveis. 

O que fazer quando as relações são afetadas pela discussão política?
Primeiramente é dar uma pausa e observar se seu stress atual tem afetado áreas do seu dia-a-dia, como trabalhar, estudar, socializar. Observe se há alteração de sono, apetite, concentração, energia e motivação. Caso perceba que o stress relacionado às eleições está afetando sua saúde mental, é hora de mudar o foco e concentrar em se cuidar. Ainda que precise se desligar de redes sociais, noticiários e interações com pessoas mais ativas nesse sentido. Não há mal algum em perceber que o stress tem tomado conta de sua vida; ao contrário: observar, aceitar e fazer as mudanças necessárias te faz uma pessoa mais forte e madura. Afinal, o que faz de nós sermos humanos é justamente a capacidade de sentir, pensar, agir e comunicar.

O que é recomendável para quem rompeu relações por causa do momento político?
A minha recomendação é sempre compreender e aceitar que nos só temos controle de nós mesmos; não é justo que exigimos dos outros o que decidimos para eles. Argumentos são importantes, desde que a comunicação seja saudável. Quando passa do limite de ser saudável, é importante dar um tempo. O pico do stress político vai passar e as relações poderão ser restabelecidas.

Como evitar que discussões políticas conturbem as relações de qualquer tipo?
Eu sou a favor do planejamento, aceitação, e esclarecimentos dos limites em épocas de eleições. Se na minha casa temos opiniões diferentes quanto ao rumo político que iremos apoiar, talvez seria mais interessante definir que não conversaremos sobre o assunto na mesa de jantar, ou mesmo entrar em acordo em que as discussões não afetarão nosso relacionamento pós-eleição. Ou, enquanto eu estiver no trabalho, eu não vou acessar assuntos políticos ou mídia social; desse modo o stress relacionado ao período não afetará meu trabalho.

Flávia Feijó

Flávia Feijó
É psicoterapeuta e Master em Mental Health, trabalhou como terapeuta em Dorchester, south Boston e Medford em Massachusetts e Atualmente trabalha na clínica da University of Colorado Health (UCH) em Fort Collins, cidade situada a 5.000 pés de altitude, na beira das famosas Rock Mountains. Flávia atende somente residentes de Massachusetts e Colorado, onde tem licença para clinicar. Para contatar Flávia Feijó use o e-mail soleilmentalhealth@gmail.com.

Jehozadak Pereira

Jehozadak Pereira é jornalista profissional e foi editor da Liberdade Magazine, da Refletir Magazine, do RefletirNews, dos jornais A Notícia e Metropolitan, do JS News e jornalista da Rede ABR - WSRO 650 AM. Foi articulista e editorialista do National Brazilian Newspaper, de Newark, New Jersey. É detentor de prêmios importantes tais como o Brazilian Press Awards e NEENA - New England Ethnic Newswire Award entre outros