Caso Lenaria: criminosa achou que conseguindo o green card estaria impune

Lenaria Aparecida Pereira Sandoval é mais um nome na longa lista de criminosos da Justiça brasileira que tentam se esconder nos EUA

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Lenaria compartilha fotos nas redes sociais. Reprodução

A prisão de Lenaria Aparecida Pereira Sandoval, na segunda-feira, 27, parecia mais uma das tantas que tem acontecido nos últimos anos e alguma operação das autoridades contra criminosos brasileiros que se refugiam nos Estados Unidos fugindo da Justiça brasileira. Porém, na medida em que as informações foram surgindo, deu-se conta que Lenaria havia assassinado José Ribeiro de Lima, 66 anos, em 4 de dezembro de 2013, em Campos Altos, MG, e depois ateou fogo no corpo dele.

Na época, o crime chocou a população da pequena cidade de cerca de 15 mil habitantes e a própria Lenaria foi ré confessa do assassinato, que em princípio tinha a cumplicidade de Juliana Aparecida de Moraes, que no julgamento foi inocentada. Durante os depoimentos, Lenaria apresentou três versões diferentes.

De acordo com documentos judiciais do julgamento, Lenaria foi considerada culpada pelos crimes de:

  1. Homícidio duplamente qualificado por motivo fútil e pelo emprego de asfixia contra a vítima;
  2. Crime de destruição de cadáver, que foi parcialmente incendiado e,
  3. Crime de furto do carro da vítima, um Fiat Strada pelo concurso de duas ou mais pessoas.

Lenaria que na época dos fatos tinha 20 anos de idade, foi condenada a uma pena de 15 anos de reclusão e mais dois anos por agravantes, totalizando 17 anos de condenação. Decidida a não responder pelo crime praticado, Lenaria deixou o Brasil em dezembro de 2015 vindo para os Estados Unidos, onde se casou e em abril de 2021 obteve o status de residente permanente (green card).

Casada com um homem, Lenaria tinha uma namorada a quem fazia juras de amor. Reprodução

Em julho de 2021, Lenaria foi ao Brasil onde ficou por algumas semanas e mesmo processada, agiu como se não tivesse praticado um crime gravíssimo. “Ela não se preocupou em demonstrar arrependimento nenhum do que havia feito. Alugou um carro e dirigia para todo lado e a vista de todo mundo, participou de festas, foi a bares e agia do jeito que bem entendia”, diz uma testemunha que não será identificada. 

Nesta ocasião ela foi notificada pessoalmente de que o seu julgamento estava marcado e assinou a intimação. Mesmo assim e de acordo com um relatório da Polícia Federal, Lenaria deixou o Brasil e voltou para os Estados Unidos.

Um ofício datado de 16 de dezembro de 2021, assinado por Mário Alexandre Veloso Aguiar, delegado-chefe da Delegacia de Polícia Federal em Uberaba/MG, informava ao juiz Saulo Carneiro Roque, Juiz de Direito da Comarca de Campos Altos, MG, que Lenaria havia deixado o Brasil via Aeroporto Internacional de Guarulhos em um voo da Delta em direção a Atlanta, Georgia no dia 28 de julho de 2021, dias depois de assinar a notificação judicial do seu julgamento. 

Em 21 de setembro de 2021, o juiz Júlio Ferreira de Andrade ao proferir a sentença de condenação afirmou “(…) A acusada não compareceu ao julgamento perante o Tribunal do Júri, o que entendo ser até um direito da acusada (que afinal tem direito constitucional ao silêncio). Contudo, esse direito deve ser exercido por quem tem endereço fixo, facilmente identificado. Não é o caso da acusada que está, segundo a defesa, nos Estados Unidos. Quem está fora do país respondendo a um processo criminal dessa gravidade, deve informar, de forma clara, que vai (ou foi) para os Estados Unidos, além de comprovar a residência no exterior o que não ocorreu no caso concreto”. 

Ainda em 21 de setembro de 2021, juiz Saulo Carneiro Roque, assinou o mandado de prisão contra Lenaria, que passou a ser considerada foragida da Justiça brasileira.

Morando em Massachusetts, Lenaria trabalhava em uma pizzaria em Quincy, cidade nos arredores de Boston e mesmo legalmente casada com um homem, vivia um romance com uma namorada e mantinha contas nas redes sociais, onde mostrava sua paixão pela mulher com declarações de amor.

Na ordem de captura, Lenaria é definida como ‘perigosa’ e ‘violenta’. Reprodução

Muitas pessoas que sabiam do assassinato cometido por ela no Brasil tinham receio de falar alguma coisa, temendo possíveis represálias. O nome de Lenaria foi incluído na Difusão Vermelha da Interpol ainda em setembro de 2021, o que possibilitou a sua captura pelas autoridades americanas. Na ordem de captura internacional, Lenaria é definida como perigosa e violenta pela Interpol.

“Lenaria apostou que fugindo do Brasil e obtendo o green card nos Estados Unidos, estaria impune do crime que ela cometeu. A arrogância e a falta de noção dela achando que nada aconteceria com ela de nada valeram. Agora que foi presa vai finalmente pagar pela atrocidade que fez e trazer um pouco de paz para a família do homem que ela matou”, afirma uma outra pessoa que também não será identificada.

Situação imigratória
No press release que comunicou a prisão de Lenaria, o ICE informou que ‘Embora (Lenaria) Sandoval tenha procurado e obtido uma mudança em seu status de imigração nos Estados Unidos em abril de 2021, as autoridades de imigração descobriram que ela não divulgou suas acusações criminais quando solicitou essa alteração. Ao deixar de divulgar essas acusações de forma fraudulenta, ela violou os termos da mudança em seu status de imigração’.

A reportagem do Metropolitan News USA perguntou ao advogado Danilo J. Brack, especialista em direito imigratório, o que significa essa omissão e quais são as consequências. Confira a seguir a resposta de Brack.

“O formulário específico do Green Card (mudança de status para residência permanente) pergunta se a pessoa já foi presa, indiciada, acusada ou detida por qualquer tipo de autoridade oficial, incluindo imigração, guarda-costeira, militar ou qualquer coisa assim. Depois  o formulário pergunta se a pessoa cometeu algum crime de qualquer tipo, mesmo que não tenha sido preso, indiciado, acusado ou julgado por este crime, independente de resultado. Pergunta ainda se a pessoa alguma vez se declarou culpado de algum crime, se já foi um réu ou um acusado em alguma acusação criminal. São quatro perguntas feitas especificamente – perguntas 25, 26, 27 e 29, que muita gente responde errado e que são um problema e é por isso que o aplicante precisa da assistência de um advogado de imigração que vai saber como agir. São perguntas que vão além de a pessoa ser culpada ou não e se estas perguntas foram respondidas erroneamente, o aplicante pode ser atuado por fraude imigratória que em si é uma base para deportação, revogação do green card e até de cidadania se este for o caso. Há casos que muitos anos depois de a pessoa ter obtido a cidadania americana e o governo resolver fazer uma auditoria, ou durante algum treinamento de oficiais que revisam tudo e podem achar alguma inconsistência, ou mentira e cancelam o privilégio. Reitero a importância de a pessoa ser assistida por um advogado especializado e não por notários ou ultimamente em ‘consultores de imigração’, ou firmas que têm páginas na internet que dão a entender que são advogados de imigração quando não são. Um advogado capacitado saberá como agir ou como reverter um caso de respostas erradas como um caso que foi parar na Suprema Corte de ineficiência advocatícia. 

No caso específico da Lenaria, se as perguntas da imigração são sobre crimes e acusações em qualquer lugar do mundo, então sim. O fato dela ter omitido (o crime de assassinato) torna ela passível de deportação e o Green Card é cancelado. Se ela não tivesse omitido e tivessem aprovado aí seria outra história”, conclui o advogado de imigração Danilo J. Brack.  

Jehozadak Pereira

Jehozadak Pereira é jornalista profissional e foi editor da Liberdade Magazine, da Refletir Magazine, do RefletirNews, dos jornais A Notícia e Metropolitan, do JS News e jornalista da Rede ABR - WSRO 650 AM. Foi articulista e editorialista do National Brazilian Newspaper, de Newark, New Jersey. É detentor de prêmios importantes tais como o Brazilian Press Awards e NEENA - New England Ethnic Newswire Award entre outros

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