A história de Gio

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O Jornal dos Sports USA publicou recentemente uma série de reportagens sobre autismo e necessidades especiais, visando o esclarecimento e ajuda para quem tem filhos nesta circunstância. Nesta edição contamos a história de Gio e a luta de Margareth para que ele tivesse os benefícios disponíveis. A seguir o depoimento de Margareth Frayne-Sodré.

Gio & Margareth
Gio & Margareth. Foto: Arquivo pessoal

“O nome do meu filho é Giovanni Ricci – Gio, e ele foi diagnosticado aos 2 anos e 8 meses de idade por uma equipe de avaliação do Childrens Hospital em Boston. O diagnóstico dele é Autismo, PDD – Pervasive Developmental Disorder. Quando Gio foi diagnosticado, ele participou por 1 ano de um programa do governo (escola pública), que ainda existe, chamado Early Intervention, que trata crianças com necessidades especiais entre 3 e 4 anos de idade e nossos planos para o Gio eram os seguintes:

1. Que a professora que o assistira nos últimos quatro anos de Middle School o acompanharia para a High School, facilitando a transição para a nova escola onde teria um número quadruplicado de estudantes e um sistema educacional mais independente com um currículo que exige bem mais do aluno. Fazer novas amizades, o que para o Gio é algo difícil, entre outras;

2. Que não haveria dificuldades nas negociações com a escola pública e que o tempo que ele lá passaria seria curto, mas estruturado;

3. Que seria fácil identificar uma nova escola que pudesse atender as necessidades dele tendo um programa adequado para seu desenvolvimento educacional e social com vistas à sua independência para a fase adulta.

O que realmente aconteceu:
1. A professora não teve permissão para acompanhá-lo, pois a escola criou uma imensidão de barreiras para impedir que isso acontecesse. O choque pro Gio foi tremendo! Algo que faz parte da desabilidade é a grande dificuldade em lidar com mudanças. Uma vez que o ambiente social, geográfico e sensorial seria drasticamente mudado, o sucesso desta transição depende em mudar o mínimo possível o sistema de suporte que a criança tem. A professora era a única pessoa constante e da confiança dele na escola, sendo assim altamente necessária para que a transição fosse um sucesso.

2. A High School pública não tinha um programa adequado para atender as necessidades do Gio, tinham somente um programa para educação especial que atendia crianças com necessidades severas, muitos não verbais. Por esta razão o Giovanni não se encaixava neste programa e foi colocado em uma sala de aula regular sem as acomodações especificadas no I.E.P.. O resultado foi um completo caos! O Gio foi rapidamente regredindo no aprendizado e na socialização. A escola havia prometido um novo assistente com experiência na área de educação especial que ficaria com o Gio por todo o período da High School, o que não aconteceu. A cada semana uma nova pessoa, inexperiente, ocupava este cargo, o que gerou inconsistência, frustração, perda de interesse e regressão imediata do Gio, sendo assim, busquei por assistência legal pela primeira vez.

Entrei em contato com a Massachusetts Advocates for Children que, após analisarem o caso, decidiram que eu precisaria de um advogado que nos foi provido gratuitamente por eles mesmos. Foi um processo penoso que durou quase três anos. Foi necessária uma nova avaliação neuropsquiátrica externa para ver se o diagnóstico continuava o mesmo. O exame custava em torno de US$ 6,500.00. A nova avaliação mostrou que o Gio perdeu o diagnóstico de Autismo com “PDD NOS” (Pervasive Developmental Disorder-Not Otherwise Specified), passando a ser “High Functioning Autism”. O neuropsiquiatra, revendo os relatórios neurológicos do Gio desde os dois anos de idade até o presente, percebeu que ele tinha todas as possibilidades de ser completamente independente aos 18 anos de idade se tivesse recebendo a educação e o tratamento apropriado de forma consistente. Desta feita, o próprio médico se voluntariou a interceder em favor do Gio junto à escola pública, dispondo-se até a ir ao tribunal, se necessário. Isso foi fundamental para ganharmos o caso. Segundo o diagnóstico do neuropsiquiatra teríamos que agir rapidamente, de maneira inteligente e agressiva, para tentar recuperar o tempo perdido e os danos causados no progresso do Gio.

Lembramos que o neuropsiquiatra é uma pessoa ideal para indicar escolas que possam atender as necessidades específicas de cada criança por ele avaliada, por isso é importante encontrar um profissional respeitado e reconhecido como autoridade na comunidade médica – isso poderá ser essencial na determinação dos resultados de disputas entre pais e escolas públicas e o sucesso na educação e tratamento de sua criança.

Gio
Gio, trabalha e estuda. Foto: arquivo pessoal

3. Chegou então a hora de buscarmos por uma escola adequada. O neuropsiquiatra nos orientou a procurar por escolas residenciais pelo fato delas proverem educação e tratamento intensivo e de 24 horas e nos recomendou que visitássemos uma escola chamada Riverview em East Sandwich, MA. Apesar de ser uma excelente escola, aos nossos olhos perfeita para o Gio, ele não estava pronto para deixar o conforto e segurança que tem em casa, então visitamos mais 6 escolas, processo também penoso que consumiu muito tempo e muita frustração, até que após oito meses de busca, conseguimos encontrar uma escola adequada chamada League School em Walpole, MA onde ele estuda desde 2013 até o momento. Estamos muito satisfeitos com o progresso e desenvolvimento do Gio, bem como com o desempenho dos educadores. Hoje o Gio está com 20 anos, terminou a High School, mas continuará até completar seus 22 anos de idade na mesma escola num programa chamado “Post-Grad”, onde adquire habilidades para atingir sua independência na fase adulta e como parte do currículo da escola ele trabalha em uma biblioteca, um supermercado e em um restaurante em Walpole, MA, com a assistência de um “job coach” construindo assim seu currículo e expondo-o ao mercado de trabalho. Trabalha também no final de semana na Legoland Discovery Center em Somerville, MA, trabalho este conseguido através de um contato que fizemos diretamente com a companhia antes de sua inauguração no Assembly Row em Somerville, MA.

Giovanni hoje é um lindo rapaz, saudável, educado, engraçado, carinhoso, inteligente, trabalhador, estudioso, dedicado, pacífico e muito talentoso. Como ele é meu filho eu poderia continuar dando-lhe louvores sem fim, mas a intenção aqui é comunicar aos leitores que há esperança para seu(sua) filho(a). Penso que o segredo de nosso sucesso é primeiramente termos colocado nossa confiança em Deus crendo que Ele nos conduz na direção certa, coloca as pessoas certas nas horas certas para que possamos ver o quanto Ele pode fazer em nossas vidas quando cremos n’Ele. Gio ainda tem um longo caminho pela frente, mas sabemos que nosso Pai celestial o ama e tem um futuro bom, perfeito e agradável para sua vida. Em segundo lugar, nunca perder a esperança de que sua criança pode ter uma vida melhor, não deixe que uma deficiência defina o futuro de seu(sua) filho(a). Em terceiro lugar, procure estar em contato com outros pais que passam pelas mesmas lutas, aflições e vitórias que vocês, compartilhem suas experiências e aprendam uns com os outros, assim ficará mais fácil enfrentar estes gigantes. Em quarto lugar, busque informar-se o melhor que puder, saiba quais são as organizações, clínicas e centros de informações que lidam com as necessidades especiais que sua criança tem, grupos de apoio familiar”.

Para acessar o Directory of Legal/Advocacy Services no Estado de Massachusetts (em inglês) clique aqui.

Jehozadak Pereira

Jehozadak Pereira é jornalista profissional e foi editor da Liberdade Magazine, da Refletir Magazine, do RefletirNews, dos jornais A Notícia e Metropolitan, do JS News e jornalista da Rede ABR - WSRO 650 AM. Foi articulista e editorialista do National Brazilian Newspaper, de Newark, New Jersey. É detentor de prêmios importantes tais como o Brazilian Press Awards e NEENA - New England Ethnic Newswire Award entre outros